29 de jan. de 2010

FSM discute Práticas antisindicais (28/01/10)

praticas antisindicais - Walter Fagundes


O segundo e último dia do Seminário “Mundos do Trabalho”, na tarde desta quinta-feira (28/01/10), tratou das práticas antisindicais, com a presença de seis centrais sindicais brasileiras: Central Geral dos Trabalhadores Brasileiros – CGTB, Central dos Trabalhadores Brasileiros – CTB, Central Única dos Trabalhadores- CUT, Força Sindical – FS, Nova Central Sindical de Trabalhadores – NCST e União Geral dos Trabalhadores – UGT. A discussão, que ocorreu no Teatro Dante Barone da AL, fez parte do Fórum Social Mundial – 10 anos – Grande Porto Alegre, e teve também a participação de centrais de outros países como a Central Geral dos Trabalhadores de Portugal – CGTP; PIT/CNT, do Uruguai; Federação União Geral dos Trabalhadores de Portugal, Sindical Mundial e Central Sindical Internacional.
Antisindical
São chamadas de práticas antisindicais aquelas que, direta ou indiretamente, cerceiam, desvirtuam ou impedem a legitima ação sindical em defesa e promoção dos interesses dos trabalhadores, explicou Lilian Arruda, do DIEESE. Em seguida as centrais que promoveram o seminário passaram a expor os problemas de práticas antisindicais enfrentados pelos trabalhadores e trabalhadoras.
Jailson Cardoso, da CTB, afirmou que são práticas que rebaixam direitos, como os planos de demissão voluntária incentivados durante a implementação do modelo neoliberal na economia. Ele afirmou que o período é difícil para os trabalhadores. “Enquanto comemora-se a criação de 100 mil novos empregos de carteira assinada, outro triste número não é falado que é ao fechamento de 100 mil vagas. O sindicalismo é atacado com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para decidir sobre a legalidade das centrais sindicais, quando a Constituição garante que é direito do trabalhador se organizar”.

Representando a CUT, Quintino Severo lamentou a ausência do Poder Judiciário no evento. “Temos vários questionamentos para este poder como a lentidão da justiça para julgar as questões que afetam os trabalhadores e trabalhadoras ou o interdito proibitório, que desde da década de 90 tem sido usado indevidamente por empresas para inviabilizar os movimentos grevistas e as próprias entidades sindicais”.

Quintino lembrou que os patrões estão obrigando os trabalhadores a se desfiliarem, promovem assassinatos de dirigentes sindicais, promovem a informalidade e a rotatividade como forma de precarizar as relações de trabalho. Ele homenageou Jair Antonio da Costa, dirigente sindical assassinado pela Brigada Militar em manifestação em Sapiranga no ano de 2005.

Por sua vez, Nilton Neco, da Força Sindical, ressaltou a maturidade do movimento sindical ao se unificar neste tema. Citou os Termos de Ajustamento de Conduta – TACs, emitidos pelo Ministério Público do Trabalho, o interdito proibitório contra os sindicatos e os assassinatos de dirigentes sindicais como os pontos mais graves da prática antisindical.

Saudando a unidade dos movimento sindical no evento, falou Francisco Calazans, da NCST. “Não deveria existir mais de uma central. A unidade daria mais força à classe”. Ele criticou o Poder Judiciário. “Até um manual de justa causa foi elaborado pelo juiz Jairo Pinto Martins. É a prova do comprometimento do judiciário com o capitalismo selvagem. Vou citar uma frase, que é emblemática, de Jorge Gerdau: Empresas precisam de profissionais especializados e não profissionais politizados. Isto diz tudo”.

Homenageando o dirigente Marcos Plata, falecido em 1996, Canindé Pegado, da UGT, trouxe a Constituição como argumento. “Em 1988 a Constituição vetou ao Estado a interferência na liberdade e administração sindical”. Como prática antisindical citou a pressão das empresas sobre os trabalhadores para que solicitem exclusão de seus nomes de processos coletivos movidos pelas entidades sindicais e contratações para substituir trabalhadores em greve.

Respondendo pelo Ministério Público do Trabalho – MPT, Ricardo Pereira afirmou que o organismo não inimigo de classe, mas é parceiro. “Falta confiança na atuação do Ministério Público. Sua função é defender os interesses dos trabalhadores, e tanto o MPT quanto o movimento sindical têm sua existência garantida através de cláusula pétrea na Constituição”. Ele se manifestou contrário à contribuição sindical. “Este caráter obrigatório dá uma sensação de que o movimento sindical se sustenta com a mão do Estado. O fim da contribuição deveria ser uma bandeira dos sindicalistas”.
 

Fórum Social Mundial - Porto Alegre - 27 de Janeiro 2010

Por uma Carta Socio-Laboral protetiva da dignidade dos trabalhadores

O jurista argentino, Luís Enrique Ramires, Vice-Presidente da ALAL - Associação Latino-Americana de Advogados Trabalhistas participou em Porto Alegre do FSM 2010,defendendo a proposta da entidade pela construção de uma sociedade plural, sem fronteiras, assegurando-se aos trabalhadores a livre circulação, com direitos recíprocos assegurados, laborais e previdenciários.

Assim foi a manifestação:

A INTEGRAÇÃO LATINOAMERICANA COMO RESPOSTA À GLOBALIZAÇÃO E À CRISE CAPITALISTA

(*) Luis Enrique Ramírez

A 23 de outubro do ano passado, os advogados trabalhistas latino-americanos aprovaram por aclamação a chamada “Declaração do México”, propondo ao movimento sindical e aos governos da região a sanção de uma “Carta Sociolaboral Latinoamericana”.
Nesse documento descrevia-se de maneira nua e crua a crise do sistema capitalista, não pela tentativa de resgate de bancos e empresas mediante a transferência de bilhões de dólares das arcas estatais para os grupos financeiros, mas, entre outras coisas, pelo bilhão de seres humanos que padecem fome e desnutrição no mundo.
Nessa oportunidade, os advogados trabalhistas diziam que a verdadeira crise da atual ordem social e econômica mundial, é a tremenda desigualdade que ela gerou, levando à pobreza e à marginalização enormes setores sociais, e até países e regiões inteiras do planeta. Situação esta que se vê agravada pela despudorada ostentação de riqueza que fazem as minorias privilegiadas, conforme as regras de uma sociedade materialista, consumista e insolidária.
Com efeito, a humanidade está passando por uma crise planetária, porém, não como conseqüência de fatos inevitáveis da natureza, mas como resultado de uma situação catastrófica provocada pela ciência a serviço do capitalismo, num caminho que nos está levando a um beco sem saída. À degradação humana da dominação e da exploração, temos que acrescentar a degradação ecológica do planeta.
Por isso, esta crise não é outra crise cíclica do capitalismo. Não: ela é uma crise de civilização que põe em questão os próprios alicerces do sistema. Enquanto os setores sociais dominantes pretendem avançar pelo mesmo caminho, com a mesma lógica e a mesma racionalidade, os advogados trabalhistas propõem pensar no alternativo.
Sua crua descrição da realidade não é produto do pessimismo, ou da desesperança dos excluídos, nem da tristeza dos dominados. É antes o ponto de partida para propor a nossos povos a imperiosa necessidade de construir um projeto de emancipação.
O reconhecimento da existência de um processo de globalização sem precedentes, que provoca profundas tensões no mundo do trabalho, é a base necessária para poder elaborar uma resposta partindo dos interesses populares, visto que é evidente que um capitalismo global só pode ser enfrentado com uma luta também a escala global. O internacionalismo que sugeria em seus começos o movimento sindical, deixa de ser um lema solidário para virar uma dramática necessidade estratégica desta conjuntura histórica.
De seu lugar, a Associação Latino-americana de Advogados Trabalhistas (A.L.A.L.) propõe na Declaração do México passar do plano da retórica e a declamação, à adoção dos cursos de ação necessários para atingir uma efetiva integração latino-americana.
Este processo encontra seu sustento em dois dados fundamentais. Em primeiro lugar, os trabalhadores e sua absoluta identidade de interesses e, em segundo lugar, uma região do planeta que apresenta características únicas para concretizar esta integração. A América Latina tem:
• Uma origem ibérica em comum;
• Línguas idênticas ou semelhantes;
• Predomínio de uma mesma religião;
• Idênticas correntes migratórias; e
• Uma história política similar.
A isto deve se acrescentar, na atual conjuntura, um cenário político que dificilmente possa se repetir, com a presença de governos populares e progressistas em muitos dos países da região.
A integração que propõe a A.L.A.L. não se reduz à criação de um bloco econômico regional, mas a uma integração que consiga superar essa visão mercantilista que se limita a discutir taxas ou a eliminação de barreiras alfandegárias.
Propõe-se uma integração que tome conta de tudo o que identifica e une os povos da América Latina, cujo destino comum é indiscutível. O que está em questão é, quem é que traçará esse destino. Será projetado pelos interesses vinculados ao capital transnacional, como historicamente tem acontecido, o por nós. Bem simples.
Trata-se, então, de rejeitar os projetos de uma mera unidade regional econômica, que com certeza nos leva a um capitalismo dependente, e propor uma autêntica integração social, política e cultural, cujo desenho e execução seja realizado com a participação de todos os setores sociais e, em particular, dos trabalhadores.
Os advogados trabalhistas latinoamericanos postulam, portanto, que o primeiro passo desse processo de integração seja a aprovação de uma Carta Sociolaboral Latinoamericana, que estabeleça um patamar comum e inderrogável de direitos de trabalho.
Esse patamar deveria ser como uma barreira infranqueável para as permanentes tentativas do neoliberalismo de destruir os direitos e as conquistas sociais dos trabalhadores. A Carta Sociolaboral Latino-americana atuará como legislação supranacional, à qual deverá se ajustar o direito interno de cada país. Ela conterá normas plenamente operativas e diretamente aplicáveis, baixando à realidade muitos direitos e garantias que já existem em nossas Constituições, mas que carecem de efetividade. Além disso, desalentará o dumping social e a especulação dos capitais que procuram vantagens competitivas, transferindo-se para aqueles países que oferecem uma mão-de-obra barata, como hoje acontece com o Peru e a Colômbia.
No entanto, não se trata apenas de estabelecer uma trincheira defensiva. Os advogados trabalhistas propõem algo muito mais ambicioso: a construção de um novo paradigma de relações de trabalho frente ao século XXI.
A Declaração do México da A.L.A.L. desenvolve em vinte pontos os principais direitos e garantias que deveria conter a Carta Sociolaboral Latinoamericana, que poderiam ser resumidos nos seguintes princípios fundamentais:
• Livre circulação e radicação dos trabalhadores no espaço comunitário, com igualdade de direitos e sem discriminação por nacionalidade.
• Direito a um trabalho decente e com estabilidade funcional, salvo ocorrência de comprovada justa causa.
• Democratização das relações de trabalho, de forma tal que o trabalhador, cidadão na sociedade, também o seja na empresa.
• A Previdência Social deve ser responsabilidade indelegável do Estado, sendo proibida a participação de operadores que atuem com fim de lucro.
• Direito à organização sindical livre e democrática.
• Direito à negociação coletiva e à greve, sem restrições regulamentares.
• Direito a uma Justiça de Trabalho especializada que, com celeridade, permita fazer efetivos os direitos dos trabalhadores.
Sendo todos estes direitos e garantias muito importantes, gostaria de salientar um que considero fundamental, porque é um direito sem o qual os outros passam a ser letra morta: o direito ao trabalho.
Tenho dito sempre que este é um dos direitos que integram a própria base de uma sorte de Pacto Social, não escrito mas claramente assumido pelos atores sociais, mediante o qual o movimento sindical abre mão de sua histórica pretensão de substituir o sistema capitalista.
Um sistema que divide a sociedade en dois setores. Um minoritário e titular dos meios de produção, e outro majoritário que conta apenas com sua capacidade de trabalho, a qual deve alienar para o primeiro para poder subsistir.
Não é muito difícil imaginar quais podem ter sido as promessas que os capitalistas fizeram aos trabalhadores para eles renunciarem a sua intenção de substituir a ordem social vigente. É claro que aqueles prometeram direito ao trabalho e a uma remuneração justa, já que somente estes direitos permitem satisfazer as necessidades vitais dos trabalhadores e de suas famílias.
É impensável que o movimento sindical tenha abandonado seus duros questionamentos ao sistema capitalista e sua originária intenção de destruí-lo, se não tivessem sido garantidos aos trabalhadores emprego e justa remuneração.
E continuando nesta linha de raciocínios, podemos afirmar que um direito de importância semelhante, que constitui uma das bases do Contrato Social que sustenta o sistema capitalista, teve que ser reconhecido num âmbito de continuidade e segurança. Em outras palavras, de estabilidade.
Porque para que o movimento sindical aceite que a satisfação das necessidades do trabalhador só se atinge através do trabalho assalariado, é lógico supor que ele teve que demandar mecanismos de segurança para garantir o direito ao trabalho. A incorporação deste direito nos textos constitucionais só pode ser interpretada como uma resposta a essa demanda.
Se a tudo isto for acrescentado que a estabilidade laboral é, de fato, uma condição para o exercício dos demais direitos laborais —já que aquele que tem uma inserção precária na empresa tem escassas possibilidades de defendê-los— então chegaremos à conclusão de que aquele Contrato Social teve que garantir aos trabalhadores, não só direito a um emprego, mas também direito a um emprego estável.

Na ordem social e econômica vigente, a estabilidade laboral é uma exigência da natureza humana. Ela representa para o trabalhador a única possibilidade de ter um projeto de vida, isto é, poder pensar no futuro a partir de uma base estável, de maneira tal que a satisfação de necessidades ainda não cumpridas se refira a um amanhã sentido como esperança.
Por isso, o direito ao trabalho, reconhecido por inumeráveis tratados internacionais, é um direito humano fundamental e deve ser intensamente tutelado. Esta proteção deve funcionar tanto frente ao Estado, como frente aos particulares.
Esta garantia significa que o Estado deve gerar políticas que permitam atingir o pleno emprego. Mas os empregadores, por sua vez, devem se abster de privar o trabalhador de seu emprego, se não mediar causa justa.
Esta nova crise do sistema capitalista, que outra vez faz recair suas consequências sobre as costas dos trabalhadores, com a destruição de empregos e a eliminação de direitos, nos faz pensar que chegou o momento de estabelecer na América Latina uma autêntica proteção contra a dispensa sem causa.
É preciso sair definitivamente dos sistemas vigentes em nossos países que sancionam a dispensa arbitrária com o pagamento de uma indenização. Esta visão puramente mercantil do valor do trabalho, que mede a demissão em termos de custos, é incompatível com o reconhecimento de que o trabalho é, na sociedade moderna, condição de cidadania. Portanto, sua perda constitui uma inadmissível degradação da condição de cidadão do trabalhador.
O direito ao trabalho está diretamente vinculado com a subsistência do trabalhador e sua família. Por conseguinte, ele está emparentado com o direito à vida, que é o primeiro dos direitos humanos fundamentais. Portanto, proteger este direito implica, necessariamente, reconhecer que o trabalhador tem o direito a não ser privado dele injustamente.
É claro que este direito pode entrar en colisão com outros direitos consagrados em nossas Constituições, como o direito de propriedade e o direito de liberdade de contratação do empregador. Porém, não há sombra de dúvida que eles têm diferente hierarquia, e a contradição entre direitos de conteúdo patrimonial e direitos humanos fundamentais, deve ser resolvida a favor destes últimos.

Resumindo: não podemos continuar denunciando as misérias do sistema capitalista, sem oferecer a nossos povos um projeto alternativo. Um passo nessa direção é começar o processo de integração latinoamericana, que é um imperativo que emana de nossas próprias raízes. Trata-se do mandato não cumprido dos heróis das lutas pela Independência.
Desde o mundo do trabalho, um bom começo seria estabelecer para todos os trabalhadores latinoamericanos um corpo de direitos de trabalho fundamentais, plenamente operativo e diretamente aplicável, como a Carta Sociolaboral Latinoamericana que propõe a A.L.A.L.
Parece uma utopia, um sonho. No entanto, como bem disse Don Quixote: “O sonho de um é apenas um sonho. O sonho de muitos é o começo da realidade”. E este Fórum Social Mundial nos convida a sonhar.

Porto Alegre, 26 de janeiro de 2010

(*) Luis Enrique Ramírez é advogado trabalhista na Argentina e Vice-Presidente Ejecutivo da ALAL – Associação Latino-America de Advogados Laboralistas


Fonte: ABRAT
http://www.fazer.com.br/layouts/abrat/default2.asp?cod_materia=2811

Mais informações sobre o FSM: http://fsm10.procempa.com.br/wordpress/